08/06/2015
A tecnologia de íon-lítio está melhorando gradualmente, mas novas pesquisas esperam acelerar o processo.
É difícil imaginar a vida moderna sem as baterias. Essas formas de armazenamento de energia criam possibilidades, sejaao conectar pessoas ao mundo por meio de dispositivos portáteis ou numa viagem de carro elétrico.
Mas, como ocorre com muitas liberdades, o preço é a a vigilância, a constante preocupação com o fim da carga.
Quem já passou algum tempo no aeroporto recentemente pode confirmar que um dos lugares mais procurados no embarque é a tomada de parede, ou as mesas com várias tomadas. E apesar das promessas do carro elétrico, a autonomia desses veículos é limitada, acrescentando uma nova expressão ao vocabulário automobilístico: "range anxiety", o medo de ficar sem batería antes de chegar ao destino.
A incapacidade do armazenamento de energia de acompanhar a tecnologia frustra muitos, especialmente os empreendedores do Vale do Silício que se queixam da ausência de uma Lei de Moore para as baterias. Esse é o nome de uma previsão feita em 1965 por Gordon Moore, cofundador da Intel, segundo a qual o custo dos microchips continuaria em queda enquanto o número de transistores instalados numa dada área de silício dobraria a cada 18 meses. Para as fabricantes de chips como a Intel, essa foi uma profecia que se fez cumprir, permitindo computadores mais potentes e mais baratos.
As baterias foram aprimoradas, mas o ritmo das melhorias não se compara ao da Lei de Moore. A maioria dos celulares e carros elétricos é agora alimentada por baterias de íon-lítio. Elas foram trazidas ao mercado pela Sony nos anos 1990. As baterias são mais leves e sua capacidade aumentou muito com os anos, como atestam os laptops e smartphones cada vez mais finos.
A batería de íon-lítio "é quase uma batería ideal", diz Vincent Battaglia, diretor do Electrochemical Technologies Group, do Laboratório Nacional Lawrence Berkeley, na Califórnia. O lítio é o metal mais leve do planeta e pode retercargas muito melhor que alternativas mais pesadas, como chumbo, zinco e níquel-cádmio. Diferentemente deste último, o material não desenvolve uma "memória", o que significa que as baterias de lítio não precisam ser esgotadas antes de serem recarregadas.
Há pontos negativos. O lítio é altamente reativo - carregá-lo em excesso e defeitos de fabricação podem resultar em curto-circuito, levando a batería a superaquecer e, às vezes, pegar fogo. Milhões de baterias de laptop foram alvo de recall e alguns Boeings 787 foram impedidos de voar em 2013 por causa de incêndios. Engenheiros conseguem hoje conter melhor esse risco.
Uma importante medida da capacidade de uma batería é sua "densidade energética"; a quantidade de energia para um dado peso ou volume. Uma bateria de lítio pode armazenar 100-250 watts-hora por quilo - mais que duas vezes uma bateria de níquelcádmio. Um carro elétrico combatería de lítio de 24 kilowatts-hora tem autonomia de cerca de 175 km.
Embora a China esteja agora aplicando sua força manufatureira à produção das baterias de lítio, essas ainda são relativamente caras: o preço costuma ser cerca de US$ 500 porkilowatt-hora de capacidade. Assim, a bateria de um pequeno carro elétrico pode custar cerca de US$ 10 mil. Muitos na indústria automotiva creem que o alcance precisa ser mais próximo dos 500 km, e o custo próximo de US$ 100 por kilowatt-hora, antes que os carros elétricos possam vingar em massa. Isso também permitiría laptops e smartphones funcionando por dias sem recarga.
Uma bateria desse tipo exigiría tuna mudança substancial na tecnologia. Muitos pesquisadores estão tentando, mas com frequência esbarram em dificuldades na hora de transformar um experimento promissor num produto comercial. Alguns cientistas não sabem se a densidade energética das baterias de íon-lítio pode ser aprimorada muito além do patamar atual sem mudanças significativas nos materiais usados para criar os eletrodos.
A equipe do dr. Battaglia trabalha naquilo que ele chama de "metais de transição". Trata-se de combinações de manganês, níquel, cobalto e grafite que podem ser acrescentadas aos eletrodos de uma bateria de lítio. Uma vezqueareceitacorretafordetermina da, a ideia é que ela aumente a densidade energética sem precisar desenvolver outro tipo de bateria Mas o re sultado seria apenas um incremento.
Outros pesquisadores são mais ambiciosos. Yi Cui e seus colegas da Universidade Stanford estão desenvolvendo películas finas - algumas delas com espessura de poucos átomos, apenas para envolver o eletrólito positivo. Isso permitiría que este contivesse mais lítio com segurança, algo que, combinado a um eletrólito negativo de enxofre (que tem altíssima capacidade energética), possibilitaria que uma bateria contivesse cerca de cinco vezes mais energia por peso do que as baterias de lítio de hoje. Um aumento de capacidade semelhante é prometido no trabalho de Chengdu Liang e sua equipe no Laboratório Nacional Oak Ridge. Eles estão desenvolvendo uma bateria de enxofre-lítio que usa um eletrólito sólido, e não líquido ou semelhante a um gel. Isso também tomaria a bateria mais estável. Os dois projetos ainda precisam de muitos anos de trabalho.
Pequenas baterias em estado sólido, como são conhecidas aquelas com eletrólito sólido, já são encontradas em pequenos dispositivos e sensores. Elas podem ser feitas com o depósito de um material num substrato, de maneira semelhante à fabricação dos semicondutores. Apesar da densidade energética altíssima, a fabricação das baterias em estado sólido é cara demais para os celulares e carros. Ainda assim, algumas empresas esperam mudar isso. A Sakti3, de Michigan, quer fazer grandesbaterias em estado sólido a base de lítio na casa dos US$ 100 por kilowatt-hora - mas não diz quando vai apresentálas. A Dyson, fabricante britânica de aspiradores de pó, recentemente investiu US$15 milhões na empresa. A Volkswagen investiu na QuantumScope, empresa do Vale do Silício que também desenvolve baterias em estado sólido.
Em tese, baterias de ar-lítio ofereceríam a melhor densidade energética afinal, o ar é ultraleve. Faz anos que pesquisadores fazem experimentos para desenvolver essas baterias, mas sem aplicação comercial à vista.
Em determinadas aplicações, no entanto, o peso não é tão problemático, e é aí que o lítio tem mais competição. Baterias gigantes estão sendo desenvolvidas para armazenar energia na rede elétrica, algo que pode transformar o mercado de fontes renováveis e intermitentes como a energia eólica e a solar. As fornecedoras de eletricidade lidam com altas na demandas acrescentando capacidade de geração - as chamadas estações "de pico". Se fosse possível armazenar o excedente de energia, menos estações desse tipo seriam necessárias, e a oferta podería ser equilibrada de maneira mais fácil e barata.
Menos deo,oi %daenergiaé armazenada atualmente, diz Philippe Bouchard, vice-presidente de desenvolvimento de negócios da EOS Energy Storage, uma startup de Nova York. "Todas as demais cadeias de suprimentos de commodities contam com alguma forma de armazenamento no ponto de geração e até a entrega final", diz. Bouchard está apresentando suas baterias de zinco, do tamanho de contêiners, para as empresas de eletricidade de Nova York e da Califórnia. O modelo de armazenamento de energia tem custo de US$ 160 por kilowatt-hora, valor que, de acordo com a empresa, toma financeiramente viável o armazenamento de energia na rede elétrica.
Outras empresas interessadas em baterias grandes incluem a GE, nos EUA, a sul-coreana LG, a japonesa NEC e startups como a Aquion Energy, nascida da universidade Carnegie Mellon, em Pittsburgh, que recebeu apoio do cofundador da Microsoft, Bill Gates.
Energia para o lar. Baterias desse tipo poderíam ser usadas por escritórios e lares. Se fosse possível acumular energia à noite, quando é mais barata, armazenando-a numa bateria a ser usada de dia, quando a tarifa é mais alta, os usuáriosdarede elétrica poupariam dinheiro. As energias solar e eólica também poderíam ser armazenadas assim, em vez de serem devolvidas à rede em troca de desconto na conta de luz. Sistemas desse tipo podem permitir que lares e empresas "abandonem a rede elétrica", ao menos em parte.
Versões menores de sistemas de armazenamento de energia em escala compatível com a rede elétrica seriam exigidas para o uso doméstico. Uma possibilidade é abatería de fluxo, que gera eletricidade quando um eletrólito líquido carregado é bombeado através dela. Em tese, a capacidade de uma bateria de fluxo é proporcional aos contêiners que armazenam os eletrólitos - algo que não seria problema para uma bateria de fluxo imóvel. Michael Aziz, da universidade Harvard, trabalha em baterias de fluxo para a rede elétrica, mas sua equipe acredita estar próxima de produzir um sistema seguro e econômico, do tamanho de um tanque domésticodeóleoparao sistema de aquecimento, podendo ser instalado no porão de um lar.
Muitas baterias de fluxo dependem do bombeamento de soluções caras que contêm metais, mas a equipe de Harvard diz que seu sistema pode ter mais potencial comercial, porque sua fabricação é mais barata do que a dos sistemas com soluções metálicas. Isso porque a bateria usa materiais orgânicos que surgem naturalmente chamados quinones, semelhantes às moléculas de armazenamentode energia usadas porplantas e animais. Hoje, os pesquisadores precisam usar bromina, material tóxico, em um dos eletrodos para aumentar o desempenho. "Não é algo que eu colocaria no porão da minha casa", admite Aziz. Mas sua equipe se mostra otimista quanto à perspectiva de encontrar uma forma de usar materiais orgânicos nos dois eletrodos. Uma bateria desse tipo seria aceita no porão de Aziz.
Podem ser necessários anos até que baterias de fluxo para uso doméstico cheguem ao mercado. Mas, se fabricadas a um custo acessível, as baterias de lítio, mais leves e compactas, podem concorrer como alternativa às baterias fabricadas com materiais mais pesados e baratos como solução de armazenamento de energia em edifícios.
Esse é o raciocínio de Elon Musk, bilionário e fundador da Tesla, produtora de carros elétricos. A Tesla está construindo uma "gigafábrica" em Nevada em parceria coma Panasonic, sua fornecedora de baterias. A produção deve começar no ano que vem e, até 2020, a produtividade deve alcançar o equivalente ao número de baterias de lítio necessárias para mover 500 mil carros.
Em vez de apostar numa revolução, a Tesla calcula que as melhorias constantes e eficiências do processo de manufatura da fábrica gigante vão reduzir o custo das baterias em cerca de 30%, ajudando a empresa a vendermaiscarros elétricos. Mas algumas das baterias também serão oferecidas a empresas e lares. Em maio, a Tesla anunciou o lançamento da bateria Powerwall para esse mercado. Uma versão de 10 kilowatt-hora terá custo de US$ 3.500 (excluindo controles e instalação). Mesmo se as grandes inovações na tecnologia de lítio não se materializarem, as baterias de lítio parecem ter pela frente um futuro brilhante.
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TRADUZIDO POR AUGUSTO CALIL PUBLICADO SOB LICENÇA. O TEXTO ORIGINAL EM INGLÊS ESTÁ EM WWW.ECONOMIST.COM.
Fonte: O Estado de S. Paulo
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